EXPEDIENTE
Boletim Informativo da Federação Brasileira de Plantio Direto na
Palha (FEBRAPDP). Instituída em 20/02/1992 Entidade de Utilidade Pública
Federal (Proc.MJ 15630/97-32) DOU 116-22/06/98
Associada a Confederación de Asociaciones Americanas para la
Producción Agropecuária Sustentable
Presidente:
Ivo Mello
Vice-presidentes:
Ariovaldo Ceratti
Hilário Daniel Cassiano
Herbert Bartz
Leonardo Coda
Flávio Faedo
Luiz Carlos Roos
Renato Faedo
1º secretario:
Benami Bacaltchuk
2º secretário:
Willem Bouman
1º tesoureiro:
Manoel Henrique Pereira
2º tesoureiro:
Cláudio Macagnan
Diretor-executivo:
Eng. agr. Maury Sade
Produção:
Eng. agr. Bady Cury, assessor técnico da FEBRAPDP
Eng. agr. Lutécia Beatriz Canalli, Emater-PR/FEBRAPDP
Jornalista responsável:
Luciana Almeida
Mtb - 5347- PR
Diagramação:
Romilda Chicoski – roroka@bol.com.br
Impressão:
Kugler Artes Gráficas
Endereço:
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Sistema de Plantio
Direto na Palha:
a pratica que diferencia a agricultura brasileira
Benami Bacaltchuk
Emprapa CNPT
O desafio da agricultura moderna, não se restringe a produzir só
quantidade, mas certamente, oferecer um produto agrícola com garantia de
qualidade dos alimentos e fibras, produzidos de forma competitiva,
considerando o ambiente e a estabilização da comunidade rural. Nos últimos
trinta anos o Sistema de Plantio Direto na Palha veio ao encontro destes
anseios sociais. O SPDP, processo de produção que contribui de forma mais
eficiente para atingir os padrões de economicidade, equidade social, e
preservação ambiental, sendo este o método que permite a agricultura
brasileira mais se aproximar das metas atuais que distingue o tripé da
sustentabilidade. O Brasil se destaca por ser o país com maior área sob
SPDP espontânea e dispõe uma organização promotora desta prática, que
agrega os produtores brasileiros, a Federação Brasileira de Plantio Direto
na Palha.
A consolidação da agricultura como processo, resultou do homem ter deixado
de ser nômade e ter se fixado onde havia abundância de alimentos. A
primeira tecnologia agrícola se caracterizou pela percepção de que algumas
espécies vegetais eram mais apropriadas para a alimentação. O fim da era
de homem caçador exigiu, também, o desenvolvimento de ferramentas de
manejo de solo como pá e a enxada, que culminou com o invento do arado de
tração animal.
Nestes, aproximadamente, 15 mil anos da história do homem “agricultor”,
certamente o advento da tração mecânica, por representar diminuição do
esforço humano para produzir, tenha sido o mais marcante.
Do descobrimento do arado de tração animal, que permitia que em áreas de
250 hectares fossem produzidos alimentos para suprir as necessidades de
até 750 pessoas/ano, a agricultura moderna, mecanizada, nesta mesma área,
se produz para 2000 mil pessoas/ano.
O crescimento populacional exigiu a expansão das fronteiras agrícolas,
originalmente através da migração dos povos europeus para o novo mundo, o
crescimento das populações nestes países, o aumento da demanda por
alimentos provocou uma significativa expansão horizontal da produção
agrícola. A migração para as novas fronteiras com tecnologias importadas
de países das zonas temperadas para tropicas, baseada num processo
derrubar-queimar-plantar e duas safras por ano, causou perceptível
degradação dos solos, exigindo a contínua migração para novas áreas. No
Brasil, em menos de 60 anos, passamos de meros 10 milhões para os atuais
42 milhões de hectares cultivadas com grãos.
A agricultura atual, além da mecanização, vale-se de inúmeras inovações,
principalmente na área da manipulação genética e manejo de culturas,
possibilitando que com os mesmos 250 hectares seja possível produzir
alimentos para mais de 3.600 pessoas/ano.
Toda esta evolução trouxe consigo conseqüências calamitosas. Dentre estas,
a degradação do solo pelo excesso de exploração e a erosão hídrica foram,
certamente, as mais problemáticas. A continuação desta expansão sem
racionalidade, certamente, causaria conseqüências irreversíveis.
No Brasil, a década de 60, foi a da expansão das fronteiras agrícolas, o
período das grandes migrações, enquanto que a década de 70 foi a da
revolução tecnológica, o período da geração de novos conhecimentos. A
ciência agrícola se destacou pela consolidação das instituições de ensino
e de pesquisa, tanto públicas como privadas, que introduziram novos
processos que liderados pela genética e pelo desenvolvimento de sistemas
de manejo de culturas e do solo, levaram o país à posição de destaque
entre os maiores produtores e exportador de alimentos. No entanto, só na
década de 90 foram ofertadas tecnologias verticalizadoras da
produtividade. Nesta década iniciou-se um movimento de consciência
sócio-ambiental que exigiu mudanças drásticas nos processos produtivos.
Na safra 1985/1986, o Brasil, cultivando uma área de aproximadamente 36
milhões de hectares, colheu 56 milhões de toneladas de grãos, enquanto que
na safra 2003/2004, numa área de 42 milhões de hectares foram colhidos,
aproximadamente 130 milhões de toneladas. Em quinze anos, a ampliação de
16% na área cultivada resultou num acréscimo de 132% no total dos grãos
produzidos. Tudo isso, fruto da adoção das novas tecnologias desenvolvidas
para as condições de cultivo nas diferentes regiões agro-ecológicas do
país. No ano de 1986, o governo brasileiro pressionado pelas políticas
internacionais de ajuste da economia, eliminou todos os subsídios para o
setor agrícola deixando a agricultura brasileira a mercê de juros
incompatíveis e de uma política inflacionária catastrófica para a
atividade. O produtor brasileiro encontrou no SPDP uma alternativa
compatível com esta nova realidade e, desta forma, o plantio direto
iniciou uma ascensão notável. Pode-se afirmar que o SPDP foi também, fator
responsável pelo crescimento do agronegócio brasileiro demonstrado pelos
números acima.
Inicialmente, a conservação de solos se restringia à construção de simples
barreiras físicas contra a erosão: – cultivo em contorno, curvas de
níveis, terraços, “murunduns” e barreiras culturais – passaram a ser a
“paisagem” que caracterizava a agricultura praticada nas diferentes
regiões do país. Mesmo com o uso de terraços de base larga, nas regiões
tradicionais, a intensidade das chuvas, a falta de uma proteção de
superfície eficiente, computavam-se perdas de até 17 toneladas de solo por
hectares/ano. Como conseqüência, a formação de grandes cicatrizes na
superfície do solo causadas por grandes valetas, as “voçorocas”, levava ao
abandono de grandes extensões de terra agrícola que se tornavam,
aceleradamente, inapropriadas para cultivo.
Alguns produtores perceberam que a continuação deste processo levaria a
destruição de áreas tradicionais de produção do país. A continuação do
processo de agricultura migratória em que a produção somente aumentava
pela expansão da área física era insustentável. O homem, que há 15 mil
anos, já havia optado pela agricultura, estava se tornando nômade como
seus antepassados. Alguns pioneiros, talvez visionários, no final da
década de 60 iniciaram, espontaneamente, a busca de novos processos de
manejo de solo. Lavrar, gradear, tantas vezes até que o solo ficasse
totalmente pulverizado, procedimento importado da Europa com a vinda dos
primeiros imigrantes alemães e italianos, estava sendo percebido como uma
prática inexeqüível e insustentável. O surgimento de uma consciência de
preservação ambiental, além de necessidade de rentabilidade, evidenciou-se
no final dos anos 80.
Por perceberem que a erosão era causada pelo impacto direto das gotas de
chuva na superfície, desintegrando as partículas do solo e fazendo com que
o acúmulo de água causasse arraste de grande quantidade de solo juntamente
com a água de escorrimento, alguns pioneiros passaram a buscar formas de
recolocar a palha resultante das colheitas na superfície do solo contra o
impacto direto da chuva.
Este foi o inicio da mais importante revolução ocorrida na agricultura
moderna tão extraordinária quanto o descobrimento da mecanização. A
presença de produtores demandando novos conhecimentos às instituições
públicas, que em parceria com empresas fabricantes de equipamentos,
passaram a desenvolver semeadoras que plantassem sem a necessidade de
revolver os solos.
Este processo denominado Sistema Plantio Direto na Palha, também conhecido
no mundo como “no-tillage”, “zero tillage”, “direct seeding”, “direct
drilling”, “labranza zero”, ou “siembra directa”, teve no Brasil
crescimento extraordinário. Hoje, 35 anos após o sua introdução,
desenvolvimento, aperfeiçoamento validação e difusão, ocupa uma área de
aproximadamente 22 milhões de hectares, o que significa 50% da área
explorada com agricultura intensiva no país.
O Sistema Plantio Direto na Palha - enfocado como um sistema de exploração
agropecuária, que envolve diversificação de espécies via rotação de
culturas, mobilização de solo apenas na linha de semeadura e manutenção
dos resíduos vegetais das culturas anteriores na superfície do solo - é um
complexo de tecnologias de processo, de produto e de serviço que submete o
agroecossistema a um menor grau de perturbação ou de desordem, quando
comparado a outras formas de manejo que empregam mobilização intensa de
solo.
Isso é justificado pelo fato de que esse complexo de tecnologias demanda
menor força de trabalho e de energia fóssil, estimula os processos de
floculação e de agregação do solo, reduz a velocidade de mineralização da
matéria orgânica, minimiza a erosão e favorece o controle biológico de
pragas, de doenças e de plantas daninhas, prevenindo o uso de
agro-químicos. Além disso, não é um sistema restritivo a estratos
específicos de produtores, independente do tamanho da propriedade, do
sistema de exploração ou da disponibilidade de recursos. Portanto, o
sistema plantio direto potencializa a obtenção do equilíbrio dinâmico do
agro-ecossistema, tendendo à produção mínima de entropia, disciplina os
fluxos de entrada e de saída do sistema, economizando energia, e conserva
o potencial biológico reservando-lhe maior capacidade de
auto-reorganização. Sob esse conceito, o sistema plantio direto na palha
comporta-se como um meio para a expressão do potencial genético das
espécies cultivadas, mediante a maximização do fator clima e do fator solo
e a minimização da degradação dos recursos naturais, atuando como um
mecanismo de transformação, de reorganização e de sustentação do
agronegócio.Esta diminuição de uso de máquinas, no Brasil, permitiu uma
redução do uso de óleo diesel que no período de 1992 a 1996, quando houve
o maior crescimento do sistema de Plantio Direto na Palha de 81 litros
para 43 litros por hectare (Landers & Freitas, 2001), enquanto que na
lavoura arrozeira irrigada do Rio Grande do Sul é computada uma diminuição
de 53 litros para plantio convencional contra 11litros por hectare para o
Plantio Direto na Palha (Vetagro, 2001). Ou sejam, 48 % e 80% menos,
respectivamente. A redução de significativo número de práticas de manejo
do solo liberaram, também, mão de obra. A potência necessária para
executar as tarefas se reduziu significativamente, diminuindo também o
volume de patrimônio imobilizado na propriedade. Esta diminuição de custo
veio associada à ampliação de tempo livre para o homem do campo o que
permitiu a diversificação de explorações, oferecendo aumento de
oportunidades de renda e rentabilidade da terra.
Se a sociedade urbana cada vez mais consciente de seus direitos apura sua
percepção de que se deve consumir alimentos produzidos com a menor
agressão ao ambiente, o Plantio Direto na Palha, além de praticamente
eliminar a erosão, diminui de forma perceptível o custo de produção, não
degrada o ambiente, e oferece oportunidade para que a propriedade aumente
a diversificação de produtos em exploração econômica, aumentando a renda
total e ocupa de forma integral a mão de obra disponível, preservando a
comunidade estável. Em outras palavras, o Plantio Direto na Palha é
sinônimo de agricultura sustentável. Na verdade, plantio direto e
agricultura de conservação são sinônimos, como enfatizado pela FAO (II
Congresso Mundial de Agricultura Conservacionista, 2003).
As tendências atuais do mercado internacional de alimentos são cada vez
mais impor barreiras não tarifárias, exigindo, dos países produtores,
práticas que não poluam, que não abusam da mão de obra, que sejam mais
competitivas e que estabilizem a comunidade rural, tem no Plantio Direto
na Palha a resposta mais adequada.
O futuro da agricultura mundial exigirá mais volume de produção. Alimentos
baratos, seguros e abundantes serão imprescindíveis para um mundo que
crescerá nos próximos 30 anos, pelo menos dois bilhões de pessoas. O
crescimento da oferta de alimentos só será exeqüível se vier associado a
processos sustentáveis, o Brasil por usar Plantio Direto na Palha é o país
que, além de aumentar a produção, o fará sem degradação ambiental e
social.
O Brasil, por ser o país com a maior área de plantio direto na palha do
mundo, precisa buscar a qualificação desta tecnologia. Este sistema
permite que o país domine a oferta de alimentos e fibras industriais, pois
possui a maior reserva de fronteira agrícola do mundo que não só dispõem
de espaço para crescer horizontalmente como, com agricultura de
conservação verticalmente. O país dispõe de conhecimento tecnológico
gerado, de profissionais habilitados para usá-lo e espaço para
implantá-lo. Além disso, esta agricultura permite a implantação de um
certificado diferenciador. A qualificação do sistema permitirá vender
produtos com identidade que assegurem aos consumidores sua origem e
qualifiquem o produto com marca Plantio Direto na Palha como o produto
padrão Brasil.
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